2 de maio de 2012

Acervos Virtuais

Vendedor de lotação Mode [On]

"Eu poderia estar fazendo um post sobre o contexto histórico do dia do trabalho. Eu poderia estar fazendo um post sobre o trabalho do Historiador, mas vim aqui, humildemente pedir um minuto de sua atenção..."

Vendedor de lotação Mode [Off

Vamos falar de acervos e interatividade?

Hoje dei de cara com uma notícia sobre um projeto fantástico em desenvolvimento na Inglaterra com um dos melhores acervos de música do mundo, do famoso radialista e DJ John Peel, sendo disponibilizado na internet.

Falando assim para quem não conhece o trabalho dele, parece pouco ou desnecessário (em plena era dos iPods e MP3s), mas quem curte discografias e história da música (principalmente do Rock e do Punk Rock) já ouviu falar das fantásticas "The John Peel Sessions" - Gravações especiais que milhares de bandas faziam nos estúdios da BBC a convite do próprio, de onde invariavelmente saíam versões maravilhosas e até músicas inéditas - e sabe que o cara é responsável por lançar artistas que ninguém nunca tinha ouvido falar. Eu particularmente não vivo sem as do Joy Division, do Echo e the Bunnymen, do New Order e do The Cure (dá uma olhada na listinha de artistas que passaram por ele)

Colecionador minucioso, ele acumulou discos e gravações de todas as bandas que conheceu, com direito a fichinhas para cada um deles. Não é a toa que hoje existe um instituto dedicado a manter seu acervo e incentivar novos artistas - o The John Peel Center for Creative Arts - que em parceria com a BBC e Arts Council England criaram um site onde pode-se navegar literalmente em sua coleção.

(clique na imagem para ir ao site)

Feito de uma forma bem intimista, o site nos transporta direto para o escritório dele em casa, onde os objetos destacados em amarelo dão acesso à setores do arquivo, como fotos, gravações, transmissões de rádio, etc. De todos, o destaque é a coleção de Lps - que está virando uma grande enciclopédia virtual dos álbuns e é nela que mora o grande destaque do site: a parceria entre os institutos prevê que se possa ouvir cada um dos álbuns na íntegra, apenas os "puxando" da estante.


A navegação é feita exatamente de forma a permitir que se puxe o disco direto da estante original de Peel e que se visualize a ficha feita por ele, a capa, contra-capa; com um link para o áudio na íntegra no Spotify. 

Por enquanto somente os álbuns com a letra A estão disponíveis e nem todos tem o link de áudio. O resto do site eu ainda não explorei, mas não quis gastar a graça toda em um dia só. Pretendo perder um bom tempo da minha vida revirando essas estantes, além de acessar as outras áreas do escritório. 

Melhor que qualquer joguinho online...

Mas a brincadeira tem um aspecto importante no tocante à História e sua relação com a internet: Mais do que simplesmente jogar o conteúdo online com a desculpa de sua importância histórica, o projeto tal como foi concebido permite que se tenha uma experiência única e plena em relação a uma coleção ou acervo.

Nem indo pessoalmente à casa de Peel, nenhuma pessoa conseguiria tempo e foco para olhar, ouvir e conhecer cada detalhe de forma tão minuciosa. Além disso a disponibilização do conteúdo vai na contramão da lógica protecionista de direiros autorais, sem em nenhum momento feri-la. Ouvir o áudio dos álbuns não vai prejudicar nenhum dos artistas, pelo contrário é até capaz de revitalizá-los ou ajudar nas vendas.

Porém até mesmo no meio acadêmico não existem muitos projetos em que se tenha tamanho empenho em disponibilizar ou integrar a experiência interativa à divulgação. 

Tecnologia existe. 

Será que falta saco para fazer algo elaborado ou é simplesmente desprezo e protecionismo?

Das poucas iniciativas que existem, uma também fantástica e bem conhecida dos historiadores e arqueólogos é o Theban Mapping Project - que (apesar de sobreviver às custas de doações e promover viagens turísticas) tem como objetivo mapear literalmente todos os sítios arqueológicos do Vale dos Reis e da Necrópole Tebana. Além de milhares de fotos, mapas de satélite, modelos em 3D, etc. o site tem um atlas virtual onde se pode navegar por cada uma das tumbas e explora-las virtualmente.

(clique na imagem para ser direcionado ao atlas)

Por enquanto só o Vale dos Reis está disponível, mas todas as tumbas tem um vídeo de introdução, mapas, fotos, detalhes de cada faraó e até mesmo a tradução completa de seus nomes (basta passar o mouse sobre os hieróglifos).


A KV14 - tumba de Tausert e Setnakht - é a única que tem um walkthrough em vídeo que permite um passeio completo e detalhado, todo interativo, pela tumba adentro, com a narração do egiptólogo Kent Weeks.

Outro projeto - que não parece tão atraente quanto os anteriores, mas é de vital importância - é o Zafar Virtual Museum, que tem como objetivo recriar o Zafar Site Museum do Iêmen. Apesar do visual pobrinho e da navegação um tanto quanto primária, o site é a única forma de acessar a coleção de artefatos arqueólogicos escavados na região, que datam do período do Reino Himyarita (115 A.C. - 520 D.C.). 

 (Clique na imagem para ser redirecionado ao site)

Isso por que a instabilidade política da região ocasionou diversos problemas. O museu chegou a ser esvaziado em 1981 e reaberto em 2002 pela equipe da Universidade de Heidelberg, mas hoje não permite a entrada de estrangeiros, apenas da população local. (Fonte: AWOL - The Ancient World Online)

O que eu deixei por último de propósito é um dos melhores projetos coletivos em termos de interatividade, mas minha implicância com ele é o aspecto dúbio da postura do Google em relação à divulgação e acesso.  Não que seja exatamente culpa deles...

Explicando com calma, boa parte das minhas pesquisas é feita com ajuda do Google - não só a ferramenta de buscas, mas de dois serviços que considero indispensáveis - o Google Books e o Google Acadêmico. Neles pesquiso artigos e livros, principalmente alguns que não estão disponíveis (edições esgotadas, antigas, livros que não vendem no Brasil e/ou que seriam absurdamente caros de comprar), porém quem já acessou as páginas sabe que volta e meia (falando do Google Books, o que uso mais) os livros disponíveis aparecem incompletos, com páginas bloqueadas. Sem contar que existe um limite de visualização, que logo atingido, não permite que se veja mais nada. 

Por que não é culpa deles? Bem, um gigante como o Google não pode se dar ao luxo de peitar ninguém e depende de autorizações para divulgar qualquer coisa. Apesar de pregar (e realmente trabalhar muito) em termos de democratização da informação, eles não podem fazer tudo. E se nem o Google pode, quem pode?

Acho o fim da picada, especialmente em trabalhos e livros acadêmicos, que o direito autoral seja tão limitante, mas vivendo em um país onde até a cópia de capítulos é proibida (sim, aquela grana toda que gastamos na faculdade com xerox nos torna infratores, sabia?), não posso reclamar muito. O Google fez mais por minhas pesquisas que qualquer editora do mundo.

Então, mesmo ressabiada com esses impedimentos, resta um pouco de empolgação com o Google Art Project - nova plataforma que reúne acervos de milhares de museus do mundo inteiro em um só lugar, com um grau muito bom de interatividade. 

 (Clique na imagem para ser redirecionado ao site)

Logo de cara já é carregada a imagem, em alta resolução, de uma obra aleatória, com nome, museu de localização, autor (no caso de obras autorais) e uma lente que permite visualizar em detalhes conforme se arrasta a obra.

Uma lista imensa de museus permite que se navegue cada uma das coleções, com detalhes de cada peça, e montar sua própria galeria de favoritos.


A mesma tecnologia utilizada no Google Street View, permite até que se "caminhe" por dentro do museu, visitando sala por sala. No caso eu escolhi o MET - Metropolitan Museum of Art em Nova Iorque.


Pena que não fizeram isso com o Zafar Site Museum...

Infelizmente só conheço esses projetos, mas gostaria de saber se existem outros. Espero que apareçam muitos mais, afinal são projetos assim que realmente utilizam ao máximo a tecnologia em prol da divulgação e interatividade, estimulando a exploração e conhecimento.

Enquanto espero, vou gastar os próximos feriados explorando esses aí.

Um comentário:

none disse...

"até a cópia de capítulos é proibida"<=Tem a lei 10.695/2003 incluiu modificação no art. 184 da lei dos direitos autorais e em seu parágrafo 4o permite a cópia em exemplar único.

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2003/L10.695.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del2848.htm#art184
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[]s,

Roberto Takata